segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

DIREITO E PODER ECONÔMICO



DIREITO E PODER ECONÔMICO



Conexões:

Boaventura de Sousa Santos em: ESTADO SOCIAL, ESTADO

PROVIDÊNCIA E DE BEM-ESTAR e

Mauro Santayana em: “OS QUE DEVEM MORRER



“O estado social é o resultado de um compromisso histórico entre as classes trabalhadoras e os detentores do capital. Este compromisso foi a resposta a uma dolorosa história recente de guerras destrutivas, lutas sociais violentas e crises econômicas graves. Este modelo de estado e de capitalismo começou a ser atacado a partir dos anos 1970 até a seu cume nos anos 1990 por um modelo alternativo, designado por neoliberalismo. É um ataque ideológico, ainda que disfarçado de uma nova racionalidade econômica”(...).

Boaventura de Sousa Santos



“ A ciência prolonga a vida dos homens; a economia liberal recomenda que morram a tempo de salvar os orçamentos. O Ministro das Finanças do Japão, Tas Aro, deu um conselho aos idosos: tratem logo de morrer, a fim de resolver o problema da previdência social. Este é um dos paradoxos da vida moderna. Estamos vivendo mais, e, é claro, com menos saúde nos anos finais da existência. Mas, nem por isso, temos que ser levados à morte. Para resolver esse e outros desajustes da vida moderna, teríamos que partir para outra forma de sociedade, e substituir a razão do “êxito” e da riqueza pela ética da solidariedade”(...). Mauro Santayana



DO DIREITO

A elaboração intelectual enseja os vícios arraigados no seio da humanidade que perduram ao longo dos séculos, se enfraquecendo em períodos de grandes resistências revolucionárias, mas sempre renascendo pelas mãos da ganância.

Seja com fulcro no engano, ou na má fé, trazem as distorções de valores para a vida prática, e, quando obram no Direito, (e sempre obram) tornam esse instituto e meio de vida totalmente órfão do justo, e suas operações na vida prática se caracterizam por atos totalmente destituídos dos aspectos axiológicos (dissociados dos valores do povo), visto que versam eivados do cunho ideológico da classe dominante..

Do exame de qualquer sistema de direito positivo, somos inevitavelmente levados a concluir que as forças econômicas influem de modo decisivo na modelação do núcleo legal, pelo menos, no mais importante de suas normas.

Por contraste, se excluirmos do estudo e da compreensão dos sistemas jurídicos, os fatos econômicos, veremos que:

- desde os grupos sociais que pela natureza de suas vidas, mais estão envolvidos em eventos que os levam as barras da justiça penal;

-as relações dos grupos econômicos entre si multinacionais e pequenos nacionais;

-bem como aqueles que atuam na ordem política ( vide o julgamento da ação penal 470) do Estado Novo;

não restarão mais exposições de motivos, que justifiquem qualquer norma jurídica.

Assevera Harold J. Laski: -“A ordem legal é a máscara por trás da qual um interesse econômico dominante garante os benefícios da autoridade política. O Estado, como funciona, não procura deliberadamente justiça ou utilidade geral, mas o interesse, no sentido amplo, da classe dominante da sociedade”.

Para não tornar demasiado extenso não cabível aqui, passando a vôo de pássaros pela história.

Observamos ao longo da história do desenvolvimento da cultura ocidental, o domínio da classe dominante, que tem sido exercido através da força física pessoal, passando num momento posterior às milícias ou exércitos mercenários particulares e por fim, para a conservação desses privilégios, era preciso lhes dar o prestígio da legalidade.

Assim, a classe dominante ao longo do tempo fez e as leis em seu proveito, o que lhe era fácil, uma vez que só ela as fazia. Mas isso não era sempre suficiente dado o estado primitivo da cognição das massas. Então se travestindo dos mantos religiosos, em muitos casos acostados bispado da Igreja Católica deu-se o prestígio do direito divino, para torná-las respeitáveis e invioláveis, a fim de assegurar o respeito da parte da classe submissa que se tornava mais numerosa, e mais difícil de conter, mesmo pela força. Não havia senão um meio, de impedi-la de ver claro, quer dizer, mantê-la na ignorância.

No Brasil pela sua característica secular de desenvolvimento sob a batuta de colonizadores o Direito está eivado de dispositivos protetores dos dominantes em detrimento dos dominados, o povo.

Como Laski, de forma transversal, mas no mesmo sentido, João Batista Herkenhoff coloca o dedo na ferida nua e crua de nossa realidade firma categoricamente:

-“ O Direito positivo brasileiro está perpassado da ideologia capitalista. Exemplos frisantes dessa presença podem ser encontrados no código Penal onde a defesa da propriedade privada suplanta a defesa da incolumidade da pessoa humana”

E, Ilustra de forma brilhante o eminente jurista em seu livro “Introdução ao Direito” que expõe na pergunta 225.[1]



“P. Que exemplos podem ser dados da presença da ideologia capitalista, no sistema legal brasileiro?”



R. - Todo o direito brasileiro está perpassado da ideologia capitalista. Exemplos frisantes dessa presença podem ser encontrados no Código Penal, onde a defesa da propriedade privada suplanta a defesa da incolumidade da pessoa humana (grifo nosso).

Vejamos:

a) latrocínio art. 157, § 3º. – é punido com mais severidade ( 20 a 30 anos de reclusão) do que o estupro seguido de morte – art. 213, combinado com 223, parágrafo único ( 12 a 30 anos de reclusão)”

Há que se observar que até pouco tempo ( 2008) a pena era de 12 a 25 anos nesse segundo caso.



Façamos uma “operação matemática”: cancelando a morte nos dois casos, e de forma simplificada temos:



-Latrocínio, roubou um celular, seguido de morte.

-Estupro, conjunção carnal seguido de morte.



Como: morte = morte, então segue-se que:

roubo do celular = conjunção carnal ( a força)



Temos que: a subtração de um celular é punida com mais rigor ( 20 a 30 anos de reclusão) que a subtração da dignidade humana ( 12 a 30 anos de reclusão).

E, mesmo a pena tendo sido estendida recentemente até 30 anos (estupro ) ainda limita à punições menores pois se o estuprador não for classificado no grupo PPP, é legal que ele seja condenado a 12, 13, 14... até 30 anos enquanto que a subtração do celular legalmente sempre será no mínimo 20 anos.

A única forma de refutar essa verdade dispositiva no Direito Penal, é tergiversar a venda de que a morte no estupro é menos morte que no latrocínio.



Acredito portanto, termos demonstrado de forma concreta, e que torna-se irrefutável, por não se cingir exclusivamente, nos aspectos sociológicos ou filosóficos, mas sim à materialidade que disciplina o dia-a-dia real do povo submisso a esse poder-trator.

Não nos alenta muito no entanto que ordenamento jurídico seja paulatinamente modificados aniquilando todos esses dispositivos nefastos e protetores da classe dominante, visto que na falta dos mesmos inventa-se:

- teoria do domínio do fato

- a experiência da vida

- o não tinha a possibilidade de não saber

E satisfeito estará o apetite dos barões.



João Luiz Marcelino da Silva

Mestre em Físico-Química, Professor

e Advogado.






[1] HERKENHOFF, João Batista, Introdução ao Direito, Thex Editora 1996.

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